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Muitas vezes me deparo com fatos ocorridos no passado, e na maioria fico me perguntando, como aconteceu ? Como tiveram tanta coragem ? Vou explicar: Recentemente me contaram sobre uma aventura de 2 jovens nascidos na cidade de Pouso Alegre, sul do estado de Minas Gerais.

Em 1957 cruzaram as 3 Américas até o México e posteriormente o Oceano Atlântico até a Itália, totalizando 3 anos de viagem.

Até então tudo normal, não fosse esta aventura sendo feita em um automóvel Diatto SPA ano 1920.

Vamos apresentar o Diatto, depois voltamos à viagem…

Diatto Type 30 – 1925

A Diatto foi uma empresa italiana de engenharia fundada em 1835 por Guglielmo Diatto, inicialmente  produzindo veículos ferroviários e elétricos. Em 1905 especializou-se no mercado de automóveis desportivos e de luxo; a empresa permaneceu no mercado como fabricante até 1932.

Em 1921 foram construídos uma série de carros de corrida com chassis Diatto Sport , movidos por motor Bugatti de 4 cilindros, 1.500 cm³ com compressor. Os carros venceram ralis internacionais, como o Brescia Gentleman Grand Prix (Primeiro Grande Prêmio da Itália), as subidas de Susa – Moncenisio , Aosta – Gran San Bernardo . Até os chassis de corrida Bugatti do tipo “Brescia da corsa” foram, por sua vez, equipados com os potentes motores Diatto de 2 litros e 16 válvulas, comprovando a versatilidade tecnológica mútua, também aplicada às competições.

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Voltando à viagem dos dois amigos…

A história começou em Pouso Alegre, no sul do estado de Minas Gerais em 1956, onde dois amigos, Waldir Coutinho e Luiz Montouro, com pouco mais de 20 anos de idade resolveram presentear o Brasil dando o título do “recorde mundial da maior viagem já feita em um carro antigo. O planejamento e a busca por patrocínio foi feito durante um ano na cidade de São Paulo, enfrentando dificuldades técnicas, financeiras e burocráticas. Em São Paulo eles adquiriram o automóvel da aventura, um Diatto SPA ano 1920 com volante do lado direito, como eles mesmo disseram “caindo aos pedaços”.

Finalmente no dia 15 de outubro de 1957, em frente ao Palácio do Catete no Rio de Janeiro, deram a partida oficial para esta corajosa aventura com destino a Los Angeles nos Estados Unidos.

De lá dirigiram-se a Pouso Alegre, em Minas, para despedirem de amigos e parentes. Seguiram para São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, até a cidade de Sant’Ana do Livramento, um percurso de 150 dias. Até este momento eles haviam passado por algumas dificuldades, enfrentando estradas de terra, barro e chuva, o que poderia piorar. Em Sant’Ana do Livramento, ficaram parados na alfândega por 45 dias sem permissão para atravessar a fronteira com o Uruguai, o que ocorreu apenas após uma denúncia em um jornal de Santos/SP.

A partir daí passaram pelo Uruguai, Argentina, Chile, Peru onde permaneceram em Lima por aproximadamente 3 meses para reforma do Diatto, que estava com muitos problemas mecânicos; inclusive ele havia caído a noite em um rio na Cordilheira dos Andes durante um forte nevoeiro. No Equador tiveram uma das melhores recepções de toda viagem, visitaram o memorial que representa o centro da terra e muitas outras cidades. A partir daí seguiram para a Colômbia, Costa Rica, Nicarágua e Guatemala. Este percurso foi um dos maiores desafios para os 2 aventureiros e o “Diatto”, que apresentou diversos defeitos, inclusive uma das rodas traseiras soltou-se do cubo, indo cair em uma ribanceira entre pedras e matagal, levando muitas horas para o conserto do automóvel.

Abreviando um pouco a história, os aventureiros chegaram ao México, onde percorreram aproximadamente 12 mil km, passando por 22 estados daquele país. Durante a travessia do México, o “Diatto” já estava em péssimas condições mecânicas e funcionando com apenas 2 cilindros, conseguindo chegar à Montadora Dina-Fiat em Ciudad Sahagún, onde o “Diatto” passou por uma completa revisão, recuperando toda parte mecânica e ficando pronto para seguir em direção aos Estados Unidos, objetivo inicial desta aventura.

Ao chegar na fronteira do México com os Estados Unidos, foram impedidos de entrar naquele país, devido a quantidade de dinheiro que eles tinham ser insuficiente, pois era necessário o mínimo de US$ 5 mil .Decepcionados, retornaram a Ciudad de México, cansados e famintos, chegando lá com apenas 15 pesos no bolso.

A partir daí coisas boas começaram a acontecer, “já era tempo“, conheceram um senhor, “Dr, Francisco” médico e industrial; admirando a aventura dos 2 amigos resolveu ajudá-los. Ficaram nesta cidade por mais de 50 dias em busca das condições necessárias para embarcar para a Europa. Com a ajuda da Embaixada Brasileira no México, junto a Embaixada da Itália e da montadora Fiat do México, eles conseguiram os bilhetes para embarcar saindo de Vera Cruz com destino a Gênova na Itália, após 9 meses de estada no México.

Aí a viagem começou a ficar luxuosa, “merecido”, embarcaram em um navio da “Sociedade Italiana de Armamento” com cabines luxuosas, passaram por Cuba, onde permaneceram por 7 dias em Havana, visitaram várias cidades dos Estados Unidos, e seguindo para a Europa. Na França foram recepcionados pelo Cônsul brasileiro, “casado com a filha do escritor Érico Veríssimo” e na Itália seguiram para Turim, onde foram recepcionados e homenageados pelos dirigentes da Fiat.

Em Turim, o automóvel Diatto SPA 1920, foi entregue no Museu do Automóvel de Turim, onde ficou elegantemente exposto, e por informações não oficiais, ele ainda permanece no local. Uma vez na Europa, eles visitaram diversas cidades da Itália, conheceram seus pontos turísticos e visitaram parentes do Luiz Montouro que moravam naquele país. A foto acima refere-se ao momento da entrega do automóvel a um dos dirigentes do museu de Turim.

Após 3 anos da partida os 2 amigos retornaram de navio ao Brasil.

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A foto abaixo é de um Diatto 1922 de propriedade do Sr. Sylvio Carlini, também de Pouso Alegre/MG passeando com amigos em 1955. Esta foto foi gentilmente cedida pelo seu sobrinho Tito Carlini, nosso amigo e leitor, também foi quem indicou o tema desta matéria.

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Nosso agradecimento ao amigo Iran Carneiro, por fornecer o conteúdo para esta matéria.

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Matéria de

Marcus Vinicius

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Revisão de

Jaderson Gomes

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14/setembro/2023

Comments

  1. História para ser contada para o Brasil e o mundo. Parabéns por divulgar essa aventura exitosa que mesmo com tantas dificuldades chegou a um final feliz. Que Deus dê repouso e luz às almas do Luiz Montouro e Waldir Coutinho.

  2. Bela matéria Vinicius. Essa aventura teve muito pouca divulgação à época, meados dos anos cinquenta, mas realmente merece ser lembrada. Eu, nesse tempo era um menino com meus oito para nove anos, morando em Pouso Alegre. Sei que esses dois rapazes, infelizmente ja falecidos, foram recebidos com muita festa quando do seu retorno e merecem essa bela homenagem em sua memória. Quanto ao meu tio Sylvio, também falecido, era dono de outro Diatto, lembrança que inspirou essa bela matéria. Meus cumprimentos e meu abraço.

  3. Fantástica a história. Realizada em uma época sem a tecnologia que temos hoje. Uma verdadeira aventura. Lembro-me perfeitamente desse fato, tinha na época 16 anos e recordo da repercussão que teve. Lembro também da recepção da chegada deles na cidade.
    Obrigado Tito por enviar está relíquia

  4. Um país que não valoriza a sua história nunca terá um futuro brilhante. Infelizmente isso acontece com frequência nesse decadente país abençoado por Deus.

  5. Parabéns Tito Carline!! Parabéns tb por todos envolvidos nessa aventura, que felizmente foi um sucesso, apesar de todas as dificuldades da época!!São uns heróis os 2 personagens da aventura!!

  6. São esse tipo de histórias que me faz admirar cada dia mais carros antigos . Obrigado por compartilhar e nos fazer viajar pelo passado !parabéns pelo seu trabalho.

  7. Lindo.
    Não sou de Pouso Alegre mais adorei saber dessa história , imagino as dificuldades que eles tiveram.
    Parabéns à todos envolvidos.
    Parabéns Pouso Alegre.

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